sábado, 22 de fevereiro de 2020

Comissões Processantes - Decreto-Lei 201/1967.


PROCESSO LEGISLATIVO


PROCEDIBILIDADE DE COMISSÃO PROCESSANTE – DEC-LEI nº 201/1967.

O processo legislativo que dispõe sobre a responsabilidade de Prefeitos e Vereadores está previsto no Decreto-Lei nº 201 de 27 de fevereiro de 1967.

Trata-se de uma norma substanciada em vieses políticos e jurídicos. Vale ressaltar que a referida lei elenca as práticas de crimes sujeitas ao julgamento do judiciário e as práticas de infrações político-administrativas sujeitas ao julgamento da Câmara de Vereadores (exercendo função judicante).

Noutro norte, independente da ocorrência seja criminal ou infracional o prefeito poderá ter seu mandato cassado uma vez seguido o rito processual disposto no referido diploma.

Dessarte, a aplicação dos ritos inerentes ao processo deverá ser rigorosamente observada sob pena de anulação e extinção da causa em ambas esferas.

Neste tópico trataremos com foco evidente no processo político-administrativo que vai dos arts. 4º ao 6º do Dec-Lei nº 201/1967 o qual se passa na Câmara de Vereadores.

DELIMITAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA CÂMARA DE VEREADORES

Veja que o artigo 4º da referida lei disciplina as hipóteses de infrações político-administrativas que culminam com a cassação do mandato:

Art. 4º São infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato:
I - Impedir o funcionamento regular da Câmara;
II - Impedir o exame de livros, folhas de pagamento e demais documentos que devam constar dos arquivos da Prefeitura, bem como a verificação de obras e serviços municipais, por comissão de investigação da Câmara ou auditoria, regularmente instituída;
III - Desatender, sem motivo justo, as convocações ou os pedidos de informações da Câmara, quando feitos a tempo e em forma regular;
IV - Retardar a publicação ou deixar de publicar as leis e atos sujeitos a essa formalidade;
V - Deixar de apresentar à Câmara, no devido tempo, e em forma regular, a proposta orçamentária;
VI - Descumprir o orçamento aprovado para o exercício financeiro,
VII - Praticar, contra expressa disposição de lei, ato de sua competência ou omitir-se na sua prática;
VIII - Omitir-se ou negligenciar na defesa de bens, rendas, direitos ou interesses do Município sujeito à administração da Prefeitura;
IX - Ausentar-se do Município, por tempo superior ao permitido em lei, ou afastar-se da Prefeitura, sem autorização da Câmara dos Vereadores;
X - Proceder de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo.
Decreto-Lei nº 201/1967

Neste ponto é importante frisar que a matéria disciplinada pelo referido art. 4º é essencial para disciplinar a competência do órgão para julgamento da conduta do prefeito, uma vez que, se a prática realizada pelo alcaide não coincidir com os tipos previstos no artigo acima citado fugirá da alçada do órgão legislativo, e, culminará no arquivamento do processo de cassação.

Vale ressaltar que cada inciso do referido artigo 4º guarda um teor específico e subjetivo havendo de se delimitar a conduta infracional sob pena de julgamento abstrato colidindo com o primado disposto da lei de segurança jurídica (Lei nº 13.655/2018) que alterou a lei de introdução às normas do direito brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657) em seu artigo 20 que assim dispôs: “Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.”

Logo, é necessário que a aplicação da infração político-administrativa seja individualizada na conduta do agente, assim como as consequências da decisão administrativa apontadas.

DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA

Aspecto polêmico do processo disposto no Decreto-Lei nº 201/1967 é o quórum necessário para o recebimento da denúncia, uma vez que a Constituição Federal determina quórum diferente do preconizado na lei infraconstitucional para o processamento do feito. O Decreto-Lei nº 201/67 prevê em seu artigo 5º, inciso II, o que segue:

Art. 5º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:
I – (...)
II - De posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria dos presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão processante, com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos, os quais elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.
Decreto-Lei nº 201/67.

De outra banda, a Constituição Federal da República preleciona em seu art. 86, que:

 Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.

Paira, neste ponto, a dualidade contraposta entre o princípio do Paralelismo das Formas ou da Simetria e a competência privativa da União para legislar sobre normas relacionadas uma vez que a "definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União" nos termos da súmula nº 46 do STF.

Em que pese a previsão constitucional do acolhimento da denúncia em comissão processante por maioria simples ou qualificada, tem sido majoritário o entendimento do Supremo Federal, principalmente, tendo em vista a súmula vinculante nº 46 que a maioria para acolhimento da denúncia é simples e não qualificada, uma vez haver sido o texto legislativo editado pela entidade legitimada a fazê-lo, ou seja a União.

PROPORCIONALIDADE NA COMISSÃO PROCESSANTE

Trata de norma emanada pelo texto constitucional insculpido no art. 58, §1º que dita: “Na constituição das Mesas e de cada Comissão, é assegurada, tanto quanto possível, a representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares que participam da respectiva Casa.”

Desta forma temos que a composição da comissão deverá possuir seus membros divididos na proporcionalidade da representação partidária obtida na eleição dos membros da câmara de vereadores.

Desta feita, em um município que possua o número de nove vereadores de partidos distintos, não poderá repetir na mesma comissão os membros de mesmo partido em função da desproporcionalidade que resultará, ou seja, não se alcançará o pluralismo político previsto no art. 1º, V, da Constituição da República assim previsto:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
V - O pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Constituição Federal de 1988.

Desta feita, há de se verificar se existe proporcionalidade na constituição das comissões processantes, mesmo havendo sido efetuado sorteio entre seus membros, pois do contrário haverá anulação do procedimento em sua integralidade.

NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO ACUSADO

Reza o artigo 5º, inciso LV, da Constituição da República que: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”

Destarte, no bojo do processo disciplinado pelo Decreto-Lei nº 201/1967, em seu art. 5º, IV, é destacado que:

IV - O denunciado deverá ser intimado de todos os atos do processo, pessoalmente, ou na pessoa de seu procurador, com a antecedência, pelo menos, de vinte e quatro horas, sendo lhe permitido assistir as diligências e audiências, bem como formular perguntas e reperguntas às testemunhas e requerer o que for de interesse da defesa.
Decreto-Lei nº 201/1967.


Logo, é cediço que o acusado deverá necessariamente receber, pessoalmente, as intimações de todos os atos do processo com antecedência mínima de 24 horas. O que em tese não é observado na grande maioria dos processos de cassação conduzidos pelos municípios brasileiros.


JULGAMENTO

Após a conclusão da instrução deve ser disponibilizado ao denunciado prazo para apresentação de razões escritas no prazo de cinco dias, e após, a comissão emitirá o parecer final pela procedência ou improcedência da acusação e será realizada a convocação para a sessão de julgamento.

Após a apresentação da defesa serão realizadas as votações nominais sobre cada infração articulada na denúncia sendo considerado afastado, definitivamente, do cargo, o denunciado que receber votos de pelo menos dois terços dos membros da câmara.

Havendo condenação será expedido o decreto-legislativo de cassação do mandato de Prefeito. Caso ocorra absolvição o Presidente determinará o arquivamento do processo, devendo em ambos os casos comunicar à Justiça Eleitoral o resultado.

Neste ponto vale frisar que o prazo para conclusão da comissão processante não poderá ultrapassar o limite de 90 dias sob pena de arquivamento sem prejuízo de propositura de nova denúncia sobre o mesmo fato.

CONCLUSÃO

A formação e condução dos procedimentos da comissão processante prevista nos termos do Decreto-Lei nº 201/67 devem seguir as normas de direito insculpidas na Constituição Federal e, de forma complementar, na legislação infraconstitucional assim como na teoria dos atos administrativos culminando em procedimento judicante, porém, administrativo, sob pecha de nulidade.

Todos os princípios afetos ao processo administrativo devem ser estritamente observados, tais quais: contraditório e ampla defesa, presunção de inocência, liberdade e publicidade, pluralismo político, representatividade, dentre os demais previstos no ordenamento jurídico pátrio.